Sim, por isso usam teares e as bandas, ou seja, digamos que a tecnologia do uso do tear é a mesma, o modo de fazer é o mesmo, o que muda são os conteúdos: enquanto que na tapeçaria há que encontrar uma conceção plástica e estética, a qual é traduzida através de desenho e de um linguagem pictórica, na panaria recorre-se a padrões de forma geométrica fixos previamente e que se repetem em cada tecido. É importante compreender essa base para depois entender todo o caminho que se fez e partir daí. Após essa fase, e após o momento posterior em que o CNA foi extinto enquanto instituição, em 1997, restou no setor um vazio grande. No entanto, os tecelões continuaram a fazer esse tipo de panaria, mas já a panaria mais complexa, o pano de obra, foi-se perdendo com o tempo. Os panos que hoje se encontram são panos mais simples. É muito raro atualmente o pano de obra da forma que era feito, com algodão cardado tingido com indigo ou tintinha como se designa e depois tecido. Temos, assim, em mão a urgência no sentido de manter essa matriz: esse é o projeto que o CNAD tem em desenvolvimento e que está dividido em várias fases. A primeira é a certificação das técnicas tradicionais de forma a conseguir balizar os parâmetros que definem a panaria cabo-verdiana. Esta certificação, incentivará quem realiza a panaria e que, no fundo, é a sua base. A segunda é incentivar outras interpretações, ou seja, pegar nessa matriz enquanto elemento de exploração do ponto de vista estético, conceptual e técnico. Foi o que fizemos, por exemplo, no concurso de design BOKA PANU: a partir da padronagem da panaria cabo-verdiana, convidámos os criativos a lançar um novo olhar sobre o Panu di Terra e a partir daí criar conceptualmente peças com base nessa padronagem (fig. 5 e 6). Surgiram resultados realmente extraordinários, sem falsa modéstia, os quais mostram que, efetivamente, a partir dessa padronagem tão rica poderá fazer-se vários outros desdobramentos na arquitetura, no design e em outras linguagens às quais essa padronagem poderá servir de base. Essa, a meu ver, na atualidade, é uma das ações mais consistentes, pois extravasa a ideia da panaria confinada ao universo, por vezes estático, bidimensional dos têxteis, lança-se um outro olhar, permitindo que quem esteja a trabalhar na criatividade, sobretudo em Cabo Verde, olhe para essa riqueza com uma outra atenção, o que, a meu ver, é o papel do CNAD. O CNAD tem como missão criar espaço para a experimentação; preservar essa herança histórica e cultural que é a panaria e preservar, sobretudo, através da certificação. Nesta linha, vamos desembocar num outro projeto que está na base do projeto fundador do CNAD e que consiste numa rede, que designamos LEAD – Laboratório Experimental de Artesanato e Design que irá ser implementada na fase posterior. O objetivo é que em cada município onde haja uma maior incidência de uma técnica, trabalhar a partir dessa técnica. Suponhamos que temos um LEAD em Santa Catarina, por exemplo, e decidimos pegar na panaria cabo-verdiana. A partir daí, iremos trabalhar na manutenção dessa matriz, explorando todas as possibilidades que essa matriz permitir desenvolver. Por um lado, estaremos a formar e, por outro, a preservar essa matriz experimentando outras dimensões de modo a que essa também não pereça com o tempo. É, assim algo análogo à proposta do concurso Boka Panu, que lançou o desafio de transpor a matriz do Panu di Terra para outros suportes, pois se ficarmos só naquela matriz tradicional, essa matriz pode – não digo desaparecer – mas enfraquecer devido à idade de quem a faz. Se nós criarmos de forma inteligente e sustentada condições para que novos fazedores peguem nessa base do ponto de vista da investigação, do fazer, , acredito que é possível continuar a desenvolver.
Fig. 5 e 6 – Peças realizadas a partir da padronagem do pánu di téra no âmbito do concurso de design BOKA PANU, 2018,. À esquerda Spotlight, candeeiro, Anayka Bettencourt e Stephanie Oliveira; à direita, Benkinp´uvi morna (banquinho para ouvir morna), Bento Oliveira.